Outro ano passou voando, outro ano «estranho», com muitas coisas inesperadas e às vezes impensáveis acontecendo bem diante de nossos olhos. Esta é a sexta vez que estou entrando no Ano Novo junto com vocês, e pela sexta vez, junto com vocês, estou tentando desvendar o futuro e entender o que este Ano Novo pode nos trazer.
Meus leitores habituais sabem que eu acredito que as porções semanais da Torá são divinamente ordenadas, e que Deus fala ao seu povo —e a cada um de nós pessoalmente— por meio destas Parashót Shavúa. A porção da Torá para o último Shabbat de 2021 foi Shemót, a primeira porção do livro do Êxodo. Vocês podem imaginar? Entramos no livro de Êxodo —o livro de sua mão poderosa e braço estendido, o livro de seus sinais e maravilhas, com todos os gloriosos milagres e redenção— enquanto entramos em um Novo Ano de nossas vidas. Claro, isso já aconteceu antes, no entanto, essa transição entre os anos começou a assumir um significado maior para mim quando percebi que a última semana de 2021 seria selada pela segunda porção da Torá do Êxodo, Vaerá que é lida em 1º de janeiro!
O que podemos dizer sobre Vaerá? Vem depois das palavras amargas de Moisés a Deus: «Pois desde que me apresentei a Faraó, para falar-lhe em teu nome, ele tem maltratado este povo: e tu de nenhuma sorte livraste o teu povo». Claro, Moisés não sabe o que nós, leitores, sabemos: que apenas alguns capítulos depois, a vitória virá! Nesse ponto, ele está quase desesperado, tudo parece escuro e sem esperança e parece estar apenas piorando.
A segunda revelação
E é exatamente neste ponto que Moisés experimenta a segunda revelação (depois da primeira, a revelação na sarça ardente): «Falou mais Deus a Moisés e lhe disse: “Eu sou o Senhor. Apareci a Abraão, a Isaque e a Jacó, como o Deus Todo-Poderoso, mas pelo meu nome O Senhor, não lhes fui conhecido”».
Vamos contemplar esta revelação solene. Estas palavras referem-se tanto ao passado como ao futuro e, como as encontramos logo no início do novo ano, o que significam para nós? O que elas significam afinal? Esta afirmação parece contradizer o livro do Gênesis e tudo o que sabemos sobre os patriarcas: de acordo com o Gênesis, os patriarcas conheciam esse nome, porque lá ocorre com frequência. Os linguistas Hebreus pensam que a declaração, «o nome YHVH era desconhecido até que foi revelado a Moisés», é refutada por nomes como Joquebede: se Joquebede era a mãe de Moisés, seus avós deviam saber o nome de YHVH, pois deram à filha um nome onde o primeiro componente era Jáh, forma abreviada de YHVH. O mesmo pode ser dito sobre os pais de Josué, eles também deram a seu filho um nome com Yáh como o primeiro componente.[1]
Nesse sentido, vemos uma conexão muito clara entre o versículo que acabamos de citar, onde Deus revela Seu nome a Moisés (Êxodo 6:3), e o versículo 7 do mesmo capítulo, onde Deus continua a falar a Moisés dizendo: «Tomar-vos-ei por meu povo e serei vosso Deus; e sabereis que eu sou o Senhor seu Deus, que vos tiro de debaixo das cargas do Egito». Vocês se lembram que mesmo antes desta segunda revelação, Moisés deveria dizer ao povo de Israel o nome do Senhor? —esta foi uma comissão que ele recebeu em Êxodo 3, na sarça ardente?—. No entanto, prestem muita atenção, Deus não espera que os Israelitas conheçam a Ele e seu nome depois que Moisés lhes disse esse nome, entre Êxodo 3 e Êxodo 6. É somente depois que eles experimentam a realidade do Êxodo —a realidade de sua fidelidade, sua compaixão e seu poder— que eles realmente o conhecerão. Não é de se admirar, Ele «não era conhecido» assim pelas gerações anteriores, por «Abraão, por Isaque e por Jacó», porque eles não o tinham «experimentado» assim. De acordo com a tradição Judaica, os Patriarcas conheciam Deus e seu nome apenas de uma forma limitada.
Quando pensamos em Moisés, geralmente pensamos na revelação da sarça ardente e, compreensivelmente, todos nós queremos a sarça ardente em nossas vidas. No entanto, não precisamos todos desta segunda revelação à medida que aprendemos a conhecer a Deus mais profundamente, especialmente nestes tempos confusos? Rashi escreve que em sua revelação inicial na sarça ardente, Moisés não compreendeu realmente a essência de Deus; mas agora, quando Deus se revela a Moisés novamente, ele adquire uma nova compreensão do caráter de Deus. Agora Moisés começa a ver Deus sob uma nova luz: como fiel, misericordioso e compassivo. Esta é a segunda revelação e o início da porção Vaerá da Torá.
A tradição Judaica interpreta os nomes Elohím e Adonái como a explicação dos dois lados da natureza de Deus: sua justiça e sua misericórdia. Essa compreensão dos diferentes nomes de Deus explica também esses dois relatos diferentes da criação —Gênesis 1 e Gênesis 2—. O Midrásh diz que Deus originalmente criou o mundo como Elohím (Gênesis 1), mas que depois Ele é chamado de Adonái Elohím (Gênesis 2) porque viu que, sem sua misericórdia, sua criação não sobreviveria. Acho que todos podemos concordar que a humanidade está nesse ponto, onde, sem sua misericórdia, definitivamente não sobreviveria. Não é surpreendente que é precisamente com esta segunda revelação que estamos entrando neste Ano Novo?
[1]Ver: H. Segal, The Pentateuch: Its Composition and Its Authorship and Other Biblical Studies (Jerusalem: Magnes Press, The Hebrew University, 1967), pp. 4-5.
[2] Lembrem-se: estamos falando sobre o Hebraico Bíblico; no Hebraico Moderno, esse verbo corresponde mais ou menos ao «conhecer» normal do Português.
[3] 1 Samuel 3:7.
[4] Oséias 2:20.
FELIZ ANO NOVO, MEUS CAROS LEITORES! QUE SEJA UM ANO MARAVILHOSO PARA VOCÊ E SEUS ENTES QUERIDOS!
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