Páscoa: Perguntas Difíceis

Houve uma pergunta em um dos comentários do meu último artigo. A senhora citou seu pastor, que havia escrito: «Há uma inconstância na multidão que proclama “Hosana!” um dia e está gritando “Crucifica-o!” uma semana depois», e logo ela me perguntou: «Você concorda com essa visão? É a mesma multidão de pessoas que cantou “Hosana!” e mais tarde gritou “Crucifica-o!”?». Esta é uma questão muito séria. Passei anos tentando entender por que «a multidão» clamou: «Crucifica-o!» e por que «os seus não o receberam». Escrevi livros abordando esse assunto (bem como vários artigos nestas páginas) mas acredito que ainda há muito a ser dito, e a época da Páscoa seria um momento muito apropriado para voltarmos novamente a esta questão.

Por que Domingo?

Primeiro, vamos refletir sobre o fenômeno do Domingo de Ramos. Por que Jesus entrou em Jerusalém naquele Domingo em particular? Muitos leitores Cristãos ainda não sabem que a resposta a essa pergunta deve ser buscada em Êxodo 12. No início deste capítulo, Deus instruiu que o cordeiro que seria morto na véspera do êxodo, deveria ser separado quatro dias antes:

«Aos dez deste mês cada um tomará para si um cordeiro, segundo a casa dos pais, um cordeiro para cada família… e o guardareis até ao décimo quarto dia deste mês; e todo o ajuntamento da congregação de Israel o imolará no crepúsculo da tarde».

Escrevi vários artigos neste blog, tratando dos acontecimentos da última semana de Jesus (vejam, por exemplo, https://blog.israelbiblicalstudies.com/jewish-studies/last-supper-sign-jonah-2-2/ ). Não vou reconstruir a lógica desses artigos aqui, gostaria apenas de lembrar que na quarta-feira, dia 13 de Nisán, os discípulos prepararam esta refeição especial que chamamos de Última Ceia e que foi, na verdade, seudá mafséket —a última refeição antes do Jejum Galileu dos Primogênitos—. Jesus e seus discípulos comeram esta refeição na quarta-feira à noite, no início da Páscoa, quando o dia mudou para 14 de Nisán. Então Jesus foi preso à noite, julgado e condenado na manhã de quinta-feira, e crucificado durante o dia e tudo isso aconteceu durante o dia da Páscoa, dia 14 de Nisán, quinta-feira. Assim, na quinta-feira, dia 14 de Nisán, Jesus morreu na cruz; portanto, ele teve que entrar em Jerusalém no mesmo dia quando o cordeiro perfeito era para ser separado —no dia 10  de Nisán—.

Os seus não o receberam

Vocês se lembram da última pergunta que os discípulos fizeram a Jesus aqui na terra? Esta única pergunta é suficiente para entender quão grande era a diferença entre a redenção que Israel estava procurando e aquela que Jesus trouxe. Abram o livro de Atos e logo no início, na cena anterior à sua ascensão, vocês lerão: «Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?».[1] Por favor, notem que eles estão perguntando isso, não apenas após três anos de comunhão ininterrupta com Ele, mas depois de sua morte na cruz e ressurreição, após os quarenta dias que Ele havia aparecido para eles, ensinando e explicando os mistérios do plano de Deus para eles. A pergunta deles era típica, o Messias que Israel estava esperando tinha que trazer redenção e salvação ao povo de Israel.

A fé em um Messias real que restauraria o trono de Davi e, portanto, o reino de Israel, era um componente inseparável da fé em Deus e estava baseada em uma promessa bíblica .«Estabelecerei a tua semente depois de ti, que sairá do teu corpo, e estabelecerei o seu reino. Ele edificará uma casa ao meu nome, e estabelecerei o trono de seu reino para sempre. Eu serei seu Pai e ele será meu filho».[2] Nenhuma pessoa devota e crente em Israel poderia imaginar que Deus enviaria sua salvação por um salvador que não salvaria seu povo e mesmo os discípulos que Ele escolheu e ensinou continuaram a esperar isso dele. O que isso diz então, sobre todas as outras multidões de Israelitas que, ouvindo suas mensagens e vendo seus milagres, estavam absolutamente convencidas de que mais cedo ou mais tarde Ele certamente começaria a salvar e restaurar Israel? O que isso diz sobre «a multidão» a mesma multidão que gritou «Crucifica-o!»?

Agora podemos voltar à pergunta que me fizeram: «É a mesma multidão de pessoas que cantou «Hosana!», que mais tarde gritou «Crucifica-o!»? Minha resposta será inevitavelmente muito simplificada; no entanto, por uma questão de clareza, vou me permitir essa abordagem simplificada aqui. «Hosana!» designa o fato de que o povo Judeu esperou pelo Messias; «Crucifica-o!» refere-se ao fato de que Jesus não era o Messias do conceito Judaico. Jesus não veio de acordo com as expectativas Messiânicas Judaicas normais. Ele subiu ao altar, não ao trono de Davi. Ele não foi enviado para restaurar o reino de Israel, como era esperado do Messias, e nesse sentido todas as promessas Messiânicas que Israel associou à vinda do Messias, de fato, permaneceram não cumpridas durante sua primeira vinda. Portanto, por fidelidade a Deus e à sua Palavra, o povo de Israel simplesmente não poderia aceitar Jesus como seu Messias, uma vez que em sua compreensão isso teria contrariado as Escrituras. Nem foi escolha deles.

O que eu quero dizer? O fato de Jesus ter subido ao altar, não ao trono —o fato de que Ele veio para se dar como oferta— foi tão extraordinário que, assim como foi com Pedro, não foi «carne e sangue, quem to revelou, mas meu Pai que está nos céus»[3], poderia revelá-lo pelo seu Espírito. Ninguém, a não ser o próprio Deus, pode impedir ou abrir os olhos espirituais.[4] Foi Sua decisão, Sua escolha, Seu plano e em total conformidade com este plano, Jesus veio a Israel como o Messias Oculto —«como se escondesse seu rosto»—.[5]

De acordo com este plano, nosso povo não só não podia reconhecê-lo, mas também não deveria reconhecê-lo!

Na próxima vez, continuaremos a discutir esse tópico, mas hoje, antes de terminar este artigo, gostaria de lembrar a vocês uma cena do Novo Testamento. Em Lucas 19, quando Jesus se aproximou de Jerusalém: «Quando ia chegando, vendo a cidade, chorou e dizia: “Ah! Se conheceras por ti mesma ainda hoje o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos. Pois sobre ti virão dias em que os teus inimigos te cercarão de trincheiras e, por todos os lados, te apertarão o cerco; e te arrasarão e aos teus filhos dentro de ti; não deixarão em ti pedra sobre pedra porque não reconheceste a oportunidade da tua visitação”». Sabendo que Ele veio não apenas pelo seu próprio sofrimento, mas também pelo sofrimento de seu próprio povo —escolhido para não reconhecer e, assim, se tornar «inimigos por vossa causa»— Jesus chora abertamente por todo o tormento a ser desencadeado sobre Israel em seu nome…

[1] Atos 1:6.

[2] 2 Samuel 7:12-14.

[3] Mateus 16:16.

[4] Vejam o artigo sobre «olhos impedidos»: https://blog.israelbiblicalstudies.com/jewish-studies/keys-transitional-chapter-key-one/.

[5] Isaías 53:3. Vocês podem ler mais sobre esta profecia e sobre Jesus sendo o Messias Oculto para Israel, no meu livro com o mesmo título: «As Though Hiding His Face».

Trechos dos meus livros estão incluídos neste artigo (e muitos outros artigos aqui), então se vocês gostam dos artigos deste blog, vocês podem gostar também dos meus livros, vocês podem obtê-los aquiAlém disso, gostaria de lembrar a vocês, queridos amigos, que a eTeacher oferece um curso maravilhoso, onde vocês podem aprender com os comentários da Parashát Shavúa junto com sua interpretação do Novo Testamento. Como sempre, vocês podem entrar em contato comigo para obter mais informações (juliab@eteachergroup.com).

About the author

Julia BlumJulia is a teacher and an author of several books on biblical topics. She teaches two biblical courses at the Israel Institute of Biblical Studies, “Discovering the Hebrew Bible” and “Jewish Background of the New Testament”, and writes Hebrew insights for these courses.

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