Faremos algo semelhante hoje – diminuir o zoom e ver um evento que todos pensamos que «conhecemos»,mas em um mapa diferente, vendo-o em uma vista diferente. E o evento, é claro, é o Pentecoste de Atos 2. Todos nós conhecemos esta história, mas será que realmente a conhecemos?
«Chegando o dia de Pentecoste, estavam todos reunidos no mesmo lugar. E de repente veio do céu um som como o de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. E apareceram, distribuídas entre eles, línguas divididas, como de fogo, e pousou uma sobre cada um deles».[1]
VISTA NACIONAL
Shavuót. Assim, na tradição Judaica, Shavuót passou a ser entendido como a comemoração da entrega da Torá a Moisés —Jág Matán Torá— חג מתן תורה. E é neste contexto —a vista nacional— que os eventos dos dois primeiros capítulos do livro de Atos devem ser vistos.
Por exemplo, em Atos 1:4, quando Jesus ordenou a seus discípulos que não «partissem de Jerusalém», entenderíamos melhor este mandamento se lembrássemos que Shavuót é uma das três festas de peregrinação Bíblica, quando todos os Judeus devotos deveriam estar em Jerusalém. Ao lermos Atos 2, vemos estes belos e profundos paralelos entre Deus dando sua Palavra e dando seu Espírito. Em ambas as ocasiões, Shavuót torna-se o dia em que o céu se abre e o próprio Deus reivindica Seu povo. O «estrondo como uma violenta tempestade» em Atos 2 certamente ecoa o trovão de Êxodo 20:18, e o fogo de Atos é paralelo ao fogo de Êxodo. No Midrásh Shemót Rabá, temos este comentário sobre Êxodo 20: «Uma voz foi dividida em sete e elas foram divididas em setenta idiomas».[2] Hillary Le Cornu e Joseph Shulam citam uma frase midráshica ainda mais surpreendente: «A voz saiu e foi dividida em sete vozes e de sete vozes em setenta línguas, para que todas as nações ouçam. E cada nação ouviu a voz em sua própria língua e ficou maravilhada».[3] Há pouca dúvida de que Lucas conscientemente constrói estes paralelos e descreve os eventos de Atos 2 em termos de um «segundo Sinaí». Assim, temos que ser capazes de ver o Pentecoste no mapa de Éretz Yisraél do primeiro século.
VISTA DA TERRA
De acordo com o Dr. Heiser, em Gênesis 11, a história da Torre de Babel, quando o Senhor confundiu a língua e dispersou as nações, diferentes deuses, elím, foram alocados em diferentes nações e territórios. Israel não existia naquele momento, como todos sabemos, foi somente a partir de Gênesis 12 que o Senhor começou a construir a nação para si mesmo, a nação que foi escolhida para ser sua porção e seu território. O que aconteceu no Pentecoste foi um evento divino e cósmico, o início da reversão de Gênesis 11: O Senhor, Deus de Israel, começa a reclamar e a recuperar todas as nações por meio do Messias. Por isso, encontramos no texto de Lucas algumas ligações e pistas surpreendentes.Em Atos 2:5 lemos: «E habitavam em Jerusalém Judeus, homens piedosos, de todas as nações debaixo do céu. Quando, pois, se fez ouvir aquela voz, afluiu a multidão que se confundiu, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua».
elím, foram atribuídos a diferentes nações. A maioria dos estudiosos concorda que o Grego de Lucas é o melhor do Novo Testamento e que Lucas, sem dúvida, conhecia as Escrituras Hebraicas em Grego: a Septuaginta. Sua escolha de palavras em Grego não deixa dúvidas de que ele está intencionalmente enviando seus leitores de volta a Gênesis 11.
Outro elo que encontramos aqui diz respeito às famosas línguas «divididas». A mesma palavra Grega que Lucas usa para «divididas», ocorre em Deuteronômio 32:8: «Quando o Altíssimo dividiu sua herança entre as nações… De acordo com o Dr. Heiser, este versículo se refere ao mesmo evento: “o Senhor os dispersou de lá sobre a face de toda a terra”»[5] e diferentes seres espirituais, ou divindades, foram distribuídos em diferentes territórios. Agora, em Atos, Lucas propositalmente insere estas ligações em seu texto porque ele quer que seus leitores voltem mentalmente para Gênesis 11 e Deuteronômio 32: ele quer que entendamos que essas passagens formam o pano de fundo para o que está acontecendo em sua história.
Assim, Atos 2 deve ser visto como uma reversão de Gênesis 11. Lemos que «haviam em Jerusalém Judeus, homens piedosos, de todas as nações debaixo do céu». É importante entendermos, aliás, que a diáspora Judaica, a dispersão dos Judeus, não começou depois da destruição do Segundo Templo, como muitos Cristãos acreditam. Uma diáspora Judaica existiu por vários séculos antes da queda do Templo e, em meados do primeiro século da d.C., uma porcentagem muito grande de Judeus já vivia fora de Éretz Yisraél. Grandes comunidades Judaicas existiam em quase todos os lugares. Deus providencialmente colocou os Judeus nas terras que Ele queria recuperar, e para Shavuót, para este festival de peregrinação bíblica, muitos deles vieram a Jerusalém como representantes destas terras. A cena que testemunhamos em Jerusalém é uma inversão da cena em Babel lá, as nações estavam confusas e não conseguiam mais entender a língua; agora, estas nações estão confusas novamente, porque de repente, eles entendem o idioma. A reversão havia começado: o Deus de Israel começou a reclamar as terras e nações que Ele espalhou em Gênesis 11.
[1] Atos 2:1-3.
[2] Êxodo Rabá, 28:6.
[3] Hillary Le Cornu, Joseph Shulam, The Jewish Roots of Acts, Netivyah Bible Instructions Ministry, 2003, p. 60.
[4] https://nakedbiblepodcast.com/
[5] Gênesis 11:8.
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