Pentecoste: A História Que Vocês Não Conheciam

Hoje em dia, quase todo mundo usa o Google Maps para navegação, mas há cerca de vinte anos, quando surgiram os primeiros GPS, ou dispositivos de navegação, quando um objeto era localizado nele, um ponto vermelho piscando aparecia na tela e havia diferentes opções para aumentar o zoom ou diminuir o zoom. Normalmente, vocês estariam interessados na «vista da rua», mas também poderia diminuir o zoom da vista da rua para a vista da cidade, para a vista do estado, para a vista nacional e, finalmente, para a vista da terra. Então vocês ainda veriam o mesmo ponto vermelho, mas estaria situado no mapa de uma cidade, de um país ou no mapa do mundo inteiro.

Faremos algo semelhante hoje – diminuir o zoom e ver um evento que todos pensamos que «conhecemos»,mas em um mapa diferente, vendo-o em uma vista diferente. E o evento, é claro, é o Pentecoste de Atos 2.  Todos nós conhecemos esta história, mas será que realmente a conhecemos?

«Chegando o dia de Pentecoste, estavam todos reunidos no mesmo lugar. E de repente veio do céu um som como o de um vento impetuoso, e encheu toda a casa onde estavam assentados. E apareceram, distribuídas entre eles, línguas divididas, como de fogo, e pousou  uma sobre cada um deles».[1]

VISTA NACIONAL

Em primeiro lugar,precisamos lembrar o contexto Judaico deste evento: a festa bíblica de Shavuót. O que é ShavuótA palavra shavuót significa «semanas» e o festival de Shavuót marca a conclusão do período de contagem de sete semanas entre Pésaj y Shavuót. A Torá não fornece uma data específica para este festival, vinculando sua data diretamente à da Pésaj e prescrevendo a contagem de sete semanas a partir de Pésaj. A Bíblia também diz: «conte cinquenta dias», por isso, no Novo Testamento, o nome do feriado costuma ser traduzido como «Pentecoste». Vocês provavelmente sabem que Shavuót e Pentecoste são dois nomes diferentes para o mesmo festival.
Hoje, é amplamente aceito que a Torá foi dada por Deus ao povo Judeu em Shavuót. Por que? Em Êxodo 19:1, lemos que os Israelitas chegaram ao sopé do Monte Sinai «no terceiro mês». O terceiro mês é Siván; e como este também era o mês de Shavuót, os rabinos deduziram que Deus deu a Torá em
Shavuót. Assim, na tradição Judaica, Shavuót passou a ser entendido como a comemoração da entrega da Torá a Moisés Jág Matán Torá— חג מתן תורה. E é neste contexto —a vista nacional— que os eventos dos dois primeiros capítulos do livro de Atos devem ser vistos.

Por exemplo, em Atos 1:4, quando Jesus ordenou a seus discípulos que não «partissem de Jerusalém», entenderíamos melhor este mandamento se lembrássemos que Shavuót é uma das três festas de peregrinação Bíblica, quando todos os Judeus devotos deveriam estar em Jerusalém. Ao lermos Atos 2, vemos estes belos e profundos paralelos entre Deus dando sua Palavra e dando seu Espírito. Em ambas as ocasiões, Shavuót torna-se o dia em que o céu se abre e o próprio Deus reivindica Seu povo. O «estrondo como uma violenta tempestade» em Atos 2 certamente ecoa o trovão de  Êxodo 20:18, e o fogo de Atos é paralelo ao fogo de Êxodo. No Midrásh Shemót Rabá, temos este comentário sobre Êxodo 20: «Uma voz foi dividida em sete e elas foram divididas em setenta idiomas».[2] Hillary Le Cornu e Joseph Shulam citam uma frase midráshica ainda mais surpreendente«A voz saiu e foi dividida em sete vozes e de sete vozes em setenta línguas, para que todas as nações ouçam. E cada nação ouviu a voz em sua própria língua e ficou maravilhada».[3] Há pouca dúvida de que Lucas conscientemente constrói estes paralelos e descreve os eventos de Atos 2 em termos de um «segundo Sinaí». Assim, temos que ser capazes de ver o Pentecoste no mapa de Éretz Yisraél do primeiro século.

VISTA DA TERRA  

E agora, vamos nos afastar mais uma vez e ver o Pentecoste na vista da terra e vamos tentar entender o significado cósmico e global deste evento. No entanto, antes de prosseguir, gostaria de mencionar, e também recomendar aos meus leitores, os livros e o podcast The Naked Bible do brilhante estudioso de abençoada memória, Dr. Michael Heiser.[4] Esta parte específica do artigo baseia-se fortemente em sua pesquisa.

De acordo com o Dr. Heiser, em Gênesis 11, a história da Torre de Babel, quando o Senhor confundiu a língua e dispersou as nações, diferentes deuses, elím, foram alocados em diferentes nações e territórios. Israel não existia naquele momento, como todos sabemos, foi somente a partir de Gênesis 12 que o Senhor começou a construir a nação para si mesmo, a nação que foi escolhida para ser sua porção e seu território. O que aconteceu no Pentecoste foi um evento divino e cósmico, o início da reversão de Gênesis 11: O Senhor, Deus de Israel, começa a reclamar e a recuperar todas as nações por meio do Messias. Por isso, encontramos no texto de Lucas algumas ligações e pistas surpreendentes.Em Atos 2:5 lemos: «E habitavam em Jerusalém Judeus, homens piedosos, de todas as nações debaixo do céu. Quando, pois, se fez ouvir aquela voz, afluiu a multidão que se confundiu, porque cada um os ouvia falar na sua própria língua».

A palavra Grega para «confundiu» aqui é a mesma que em Gênesis 11, na história da Torre de Babel: «Por isso se chama Babel, porque ali o Senhor  confundiu a língua de toda a terra». As línguas e as nações foram então «confundidas» e foi quando, de acordo com o Dr. Heiser, diferentes deuses,
elím, foram atribuídos a diferentes nações. A maioria dos estudiosos concorda que o Grego de Lucas é o melhor do Novo Testamento e que Lucas, sem dúvida, conhecia as Escrituras Hebraicas em Grego: a Septuaginta. Sua escolha de palavras em Grego não deixa dúvidas de que ele está intencionalmente enviando seus leitores de volta a Gênesis 11.

Outro elo que encontramos aqui diz respeito às famosas línguas «divididas». A mesma palavra Grega que Lucas usa para «divididas», ocorre em Deuteronômio 32:8: «Quando o Altíssimo  dividiu sua herança entre as nações… De acordo com o Dr. Heiser, este versículo se refere ao mesmo evento: “o Senhor os dispersou de lá sobre a face de toda a terra”»[5] e diferentes seres espirituais, ou divindades, foram distribuídos em diferentes territórios. Agora, em Atos, Lucas propositalmente insere estas ligações em seu texto porque ele quer que seus leitores voltem mentalmente para Gênesis 11 e Deuteronômio 32: ele quer que entendamos que essas passagens formam o pano de fundo para o que está acontecendo em sua história.

Assim, Atos 2 deve ser visto como uma reversão de Gênesis 11. Lemos que «haviam em Jerusalém Judeus, homens piedosos, de todas as nações debaixo do céu». É importante entendermos, aliás, que a diáspora Judaica, a dispersão dos Judeus, não começou depois da destruição do Segundo Templo, como muitos Cristãos acreditam. Uma diáspora Judaica existiu por vários séculos antes da queda do Templo e, em meados do primeiro século da d.C., uma porcentagem muito grande de Judeus já vivia fora de Éretz Yisraél. Grandes comunidades Judaicas existiam em quase todos os lugares. Deus providencialmente colocou os Judeus nas terras que Ele queria recuperar, e para Shavuót, para este festival de peregrinação bíblica, muitos deles vieram a Jerusalém como representantes destas terras. A cena que testemunhamos em Jerusalém é uma inversão da cena em Babel lá, as nações estavam confusas e não conseguiam mais entender a língua; agora, estas nações estão confusas novamente, porque de repente, eles entendem o idioma. A reversão havia começado: o Deus de Israel começou a reclamar as terras e nações que Ele espalhou em Gênesis 11.

 

 

[1] Atos 2:1-3.

[2] Êxodo Rabá, 28:6.

[3] Hillary Le Cornu, Joseph Shulam, The Jewish Roots of Acts, Netivyah Bible Instructions Ministry, 2003, p. 60.

[4] https://nakedbiblepodcast.com/

[5] Gênesis 11:8.

Se este artigo despertar seu interesse por aprender mais sobre o contexto Judaico do ensino de Jesusficarei feliz em fornecer mais informações (e também um desconto de professor para os novos alunos) em relação ao nosso maravilhoso curso, Contexto Judaico do Novo Testamento ( (juliab@ eteachergroup.com). Vocês também podem gostar dos meus livros, todos eles são baseados na Bíblia e têm perspectivas Hebraicas, vocês podem obtê-los aqui.

About the author

Julia BlumJulia is a teacher and an author of several books on biblical topics. She teaches two biblical courses at the Israel Institute of Biblical Studies, “Discovering the Hebrew Bible” and “Jewish Background of the New Testament”, and writes Hebrew insights for these courses.

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